Eu estou com câncer de pele.* não consegui verbalizar isso pra ninguém, fico me repetindo que é um pesadelo e que daqui a pouco eu vou acordar, fico bancando a forte, caminhei da médica até o escritório controlando as lágrimas por debaixo dos óculos escuros, respirando fundo e me repetindo que eu sou forte, eu sou forte, eu sou forte.
update: Acabo de decidir que, assim como essa doença vai ocupar só um pedacinho da minha vida, esse assunto vai ocupar só um pedacinho do meu blog. Será um post único que vou atualizando com o que der vontade, ou não.
- (20/08), opero semana que vem, já consultei o cirurgião plástico, que de posse da biópsia positiva para carcinoma, já marcou a cirurgia, será na quinta-feira dia 28/08, às 10:00
- (21/08), Ansiedade é meu segundo nome no momento. Já que não consigo dormir, acabo de mudar de idéia e vou escrever aqui. Tinha decidido não me expor mais do que já fiz. Mas pro inferno, tenho esse blog justamente porque AMO escrever. Escrever sobre o que sinto sempre me ajuda a "digerir" melhor as coisas, pensar, refletir e mudar de idéia se for o caso.
Tá tudo uma merda. Já passei por várias fases desde o momento que a dermato me deu o resultado da biópsia e disse na minha cara: "tu tem câncer". É um choque, um soco no estômago. Minha primeira reação foi pensar que aquela mulher era uma louca desvairada e resolveu surtar logo na hora da minha consulta. Negação verbalizada, questionei do alto do meu controle emocional:
"e eu posso saber baseada em que tu tá me dizendo uma coisa dessas?
Preciso dizer que ela me esfregou o laudo do laboratório na cara? Pois é. E como uma criança de 5 anos eu não consegui achar o diagnóstico, e com o papel tremendo nas mãos, ainda completei com:
"e onde foi que tu leu isso?"
Liiiiindo!
Depois disso eu não lembro mais nada que a coitada disse. Só queria sair dali e pronto.
Maldita hora que eu resolvi vir aqui! Muito esperto da minha parte pensar assim né. Depois de quase quebrar o botão P do elevador, de tanto que apertei o coitado enquanto ele descia, eu finalmente sai daquele prédio e aí tive minha quinta ou sexta idéia brilhante do dia,
Claaaaaaaaro que quem estava errado era o laboratório, baita erro de diagnóstico e eu iria era processá-los, claro! Rá, como eu sou esperta! Negação é meu segundo nome!
Decidi que nao contaria nada pra ninguém. Mudo de idéia e resolvo ligar pra médica da cabeça, enquanto repito pra mim mesma que eu não vou chorar no meio da rua, e que eu sou forte, forte, forte... Desisto de ligar pra médica da cabeça, afinal, o que ela poderia me dizer?
Definitivamente não vou contar isso pra ninguém. Mas eu preciso falar com alguém! Depois eu penso nisso, agora eu preciso ir pra casa e ficar sozinha! Negação é meu nome e sobrenome!
Fui bem forte e decidida, até entrar no escritório e avisar a secretária que ela teria que ir ao forum porque eu não ia mais.
Eu ia pra casar me esconder, claro, fingir que aquele dia não existiu e tudo ia ficar bem! Lembrei da Natália, desmoronei. Porra, eu tenho uma filha de 5 anos que precisa de mim. Me vi careca, fazendo quimioterapia e sofrendo.
Eu não posso morrer! Dirigir nem pensar.
Ligo pro marido, forço um sorriso:
Amor, tô com muita dor de cabeça, quero ir pra casa, tu me leva?
Levo, mas vem aqui que tu está com carro, ai te deixo em casa
Não posso dirigir, tá doendo muito.
Déia, dor de cabeça não impede ninguém de dirigir, são 4 quadras só. Tu foi na médica? Que aconteceu?
- Desabei. Contei por telefone mesmo. Controle emocional zero.
Marido chega e eu choro, choro, choro.
Eu não quero morrer! Eu tenho uma filha pra criar, eu só tenho 34 anos, e blá blá bláLigamos pro cirurgião plástico, que é um querido que já fez plástica na minha mãe e tirou um sinal no rosto do marido. Ele mesmo atende e me deixa mais calma, arruma um horário pro outro dia. Aí ele resolve me perguntar, mas que idade tu tem?
Eu tenho uma voz de criança no telefone. Quando falo que 34 ele me diz que sou muito nova pra já estar com isso, que normalmente aparece depois dos 40/45.
Convenhamos que eu podia ter ficado sem essa né, pelo menos por enquanto.
Fui pra casa e chorei uns 30 litros de lágrimas. Processei umas 15 pessoas.
Nao me sinto doente é é muito esquisito como alguém pode te tirar o chão em um segundo, com uma maldita palavra.
Câncer. Câncer. Câncer.
Perdi minha avó pra essa doença, minha mãe teve e precisou fazer algumas cirurgias.
Fui pra Internet e só lia coisas sobre prevenção. Previna-se, previna-se, previna-se. Use o filtro solar. Um pânico generalizado da doença. Tá, tudo bem, fudeu, e agora? Vou morrer disso?
Descobri que o carcinoma basocelular é o mais simples deles, que não tem metástase.
Ufa. Vida normal então. Descubro uma mulher que já tirou 33 focos da doença.
Não vou morrer, mas vou ficar toda esburacada! Descubro outra, que tira e volta, tira e volta, era perto de um dos olhos, ela está cega.
Eu não quero ter isso! Porque eu? Porque? Porque? Porque? Eu só tenho 34 anos. Isso não está acontecendo comigo!Na consulta com o querido do doutor Ricardo Arnt, ele me desenhou na pele como fará o corte, me mostrou que logo em seguida do foco principal tem um segundo foco que ninguém via, nem eu, nem o marido. É uma manchinha vermelha na pele. Que por fora o que aparece são uns 2 cm, mas que o corte pode ser bem maior, que tudo depende de como o tumor já evoluiu lá dentro. Eu falei que não me importo com cicatriz, que ele tire tudo que precisa e mais um pouco pra garantir, que não me importo.
Bem fácil de falar isso porque não é no meu rosto. Eu quase implorei pra ele me garantir que não irá voltar, questionei o possível erro do laboratório, afirmei que não me sinto doente, que isso não pode ser verdade. Ele me disse que não pode garantir que não irá voltar, e que o carcinoma basocelular é o mais simples, mas pelo exame, o laboratório não errou, que o desenho mostra um tumor bem ativo, e que sim, eu tenho carcinoma, que a alteração que pode ocorrer da primeira biópsia para a segunda é em relação ao tipo do carcinoma, que como na dermato o tecido retirado é muito pequeno, cerca de 2 mm, pode dar diferença quando o tumor é analisado inteiro.
Como assim Bial? Porque tu não fica de boca fechada Andrea???Fui pessoalmente contar pra minha mãe que está em Porto Alegre cuidando da minha avó que passou por uma cirurgia. Queria que ela visse que eu estou bem. Meu pai me diz pra não chorar que isso não é nada. Fico procurando na minha memória gente com essa doença. As pessoas não contam. Isso é uma verdade. Minha dinda me disse pra não contar pra ninguém. Não vejo motivo pra isso, não tenho culpa, não é contagioso. Sim, a merda da doença existe e não acontece só com os outros, acontece comigo também! Lembrei do sogro do meu tio que morreu de câncer de pele, eu devia ter uns 12 anos e ele tinha perdido o nariz pra doença. Fui confirmar com meu pai, na verdade queria que ele falasse que eu tava doida, que era outra doença. O coitado com a cara mais desconcertada do mundo me diz: "pois é filha, eu tinha lembrado, mas não te falei pra não te deixar mais nervosa, uma vizinha da praia também morreu, afetou os olhos, mas era outra época, as pessoas não tinham informação, não tinham acesso, procuravam ajuda muito tarde.
Eu tenho essa manchinha tem pelo menos dois anos!Chorei até sabádo.
To trabalhando, e tocando a vida. Esquecer eu não esqueço um segundo. Num primeiro momento fiquei chocada, depois assustada. Agora estou ansiosa. Quero que passe logo, quero fazer essa porra de cirurgia, pegar o resultado da biopsia, levar pra um oncologista ver, ir na dermato fazer uma "busca" no corpo, me entupir de filtro solar e ir viver a minha vida.
Mas dormir já é pedir demais pra minha pessoa né... Dormir eu não durmo quase nada, e quando faço, tenho apertado tanto os dentes que estou com uma dor de ouvido dos infernos que me fez ir pro otorrino hoje e pra querida da minha ortodentista. To tomando um relaxante muscular, mas que devia ter sido em dose cavalar, porque tomei eram 22 horas e to aqui, mais ligada que lâmpada 220....
- (26/08), estou ansiosa, cada pessoa me diz uma coisa, me dá um conselho e eu fico sem saber o que fazer. O que eu queria? Queria conseguir fingir que isso não está acontecendo. Mas não dá, depois de mais de ano de terapia não acho mais a andrea que finge que os problemas não existem pra não ter que pensar sobre eles.